segunda-feira, 27 de setembro de 2010

O outro Brasil que vem aí

O outro Brasil que vem aí

(Gilberto Freyre)

Eu ouço as vozes
eu vejo as cores
eu sinto os passos
de outro Brasil que vem aí
mais tropical
mais fraternal
mais brasileiro.
O mapa desse Brasil em vez das cores dos Estados
terá as cores das produções e dos trabalhos.
Os homens desse Brasil em vez das cores das três raças
terão as cores das profissões e regiões.
As mulheres do Brasil em vez das cores boreais
terão as cores variamente tropicais.
Todo brasileiro poderá dizer: é assim que eu quero o Brasil,
todo brasileiro e não apenas o bacharel ou o doutor
o preto, o pardo, o roxo e não apenas o branco e o semibranco.
Qualquer brasileiro poderá governar esse Brasil
lenhador
lavrador
pescador
vaqueiro
marinheiro
funileiro
carpinteiro
contanto que seja digno do governo do Brasil
que tenha olhos para ver pelo Brasil,
ouvidos para ouvir pelo Brasil
coragem de morrer pelo Brasil
ânimo de viver pelo Brasil
mãos para agir pelo Brasil
mãos de escultor que saibam lidar com o barro forte e novo dos Brasis
mãos de engenheiro que lidem com ingresias e tratores europeus e norte-americanos a serviço do Brasil
mãos sem anéis (que os anéis não deixam o homem criar nem trabalhar).
mãos livres
mãos criadoras
mãos fraternais de todas as cores
mãos desiguais que trabalham por um Brasil sem Azeredos,
sem Irineus
sem Maurícios de Lacerda.
Sem mãos de jogadores
nem de especuladores nem de mistificadores.
Mãos todas de trabalhadores,
pretas, brancas, pardas, roxas, morenas,
de artistas
de escritores
de operários
de lavradores
de pastores
de mães criando filhos
de pais ensinando meninos
de padres benzendo afilhados
de mestres guiando aprendizes
de irmãos ajudando irmãos mais moços
de lavadeiras lavando
de pedreiros edificando
de doutores curando
de cozinheiras cozinhando
de vaqueiros tirando leite de vacas chamadas comadres dos homens.
Mãos brasileiras
brancas, morenas, pretas, pardas, roxas
tropicais
sindicais
fraternais.
Eu ouço as vozes
eu vejo as cores
eu sinto os passos
desse Brasil que vem aí.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Será?!

Que tal dar um tempo?
Uma fugidinha de leve não faz mal!
Vem comigo?
Tem espaço pra muita gente!

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Festa à fantasia


Levanto todas as manhãs e me arrumo para ir à festa à fantasia, abro o meu armário e escolho a máscara do dia. Tenho várias máscaras! Tem uma que eu gosto muito, nela tem um sorriso doce e simpático, acho que é a máscara mais desgastada de tanto usá-la, é a que eu mais gosto! Mas não tenho só essa, são várias! Vai depender do dia, dos acontecimentos, das circunstâncias, do meu coração, da leveza da minha alma, do tamanho da minha fé. Tenho uma com um olhar vago, distante, e um meio sorriso forçado; há outra que tem uma única lágrima delicada do lado direito; tem aquela com a sobrancelha franzida, coisa de preocupação; tem uma com expressão de euforia, é uma loucura; tem uma interessante, gosto de chamá-la de máscara da determinação; tem aquela dos óculos, para os dias em que não quero olhar ninguém nos olhos; aaah, tem uma fofa, com cara de menina sapeca sabe; assim como aquela com cara de gente grande e responsável; e outras tantas, que já devem ter me visto usando-as por aí....

Paulinha Brum

terça-feira, 7 de setembro de 2010

sábado, 4 de setembro de 2010

A Máquina da Canabrava

“No primeiro dia de aula, a professora de História da Economia, na velha USP da Rua Doutor Vila Nova, Aline Canabrava, escreveu no quadro negro o nome de um livro sobre mercantilismo e disse seriíssima:
- Na próxima aula ( dali a uma semana), prova sobre o livro.
Era o estilo dela, que eu já havia enfrentado no exame oral ( é, tinha oral) do vestibular para economia em 1967. Me lembro que ela me perguntou qual era a diferença entre uma nau e uma caravela. Na época eu sabia.
Mas o mundo é pequeno e trinta ano depois vim a descobrir que a Canabrava era tia da minha amiga escritora - arquiteta Lúcia Carvalho, aquela mesma que já andou por aqui falando de privadas e congêneres. Era tia. Morreu há um mês, já velhinha, aposentada e lúcida. Deixou sua casa – com tudo que tinha lá dentro, incluindo uma genial biblioteca- para a Lúcia.
E a Lúcia acaba de me mandar um e-mail que eu transcrevo na íntegra, sobre uma velha máquina da catedrática tia. Vamos lá.

‘ Ouve só. A gente esvaziando a casa da tia neste carnaval. Móvel, roupa de cama, louça, quadro, livro. Aquela confusão, quando ouço dois dos meus filhos me chamarem.
- Mãe!
- Faaaala.
- A gente achou uma coisa incrível. Se ninguém quiser, pode ficar para a gente? heim?
- Depende. Que é?
Os dois falaram juntos, animadíssimos.
- Ééé... uma máquina mãe.
- É só uma máquina meio velha.
- É, mas funciona, está ótima!
Minha filha interrompeu o irmão mais novo, dando uma explicação melhor.
- Deixa que eu falo: é assim, é uma máquina, tipo um... teclado de computador, sabe só o teclado? só o lugar que escreve¿
- Sei.
- Então. Essa máquina tem assim, tipo... uma impressora, ligada nesse teclado, mas assim, ligada direto. Sem fio. Bem, a gente vai digita, digita...
Ela ia se animando, os olhos brilhando.
- .... é a máquina imprime direto na folha de papel que a gente coloca ali mesmo! É muuuuito legal! Direto, na mesma hora, eu juro!
Eu não sabia o que falar. Eu ju-ro que não sabia o que falar diante de uma explicação dessas, da menina de 12 anos, sobre uma máquina de escrever. Era isso mesmo?
- ... entendeu mãe? ... ZUPT, a gente escreve e imprime, a gente até vê a impressão tipo na hora, e não precisa essa coisa chata de entrar no computador, ligar, esperar hóóóras, entrar no Word, de escrever olhando na tela, mandar para a impressora, esse monte de máquina, de ter que ter até estabilizador, comprar cartucho caro, de nada, mãe! É muuuuuito legal, e nem precisa de colocar na tomada! Funciona sem energia e escreve direto na folha da impressora!
- Nossa filha...
- ... só tem duas coisas: não da pra trocar de fonte e nem aumentar a letra, mas não tem problema. Vem, que a gente vai te mostrar. Vem...
Eu parei e olhei, pasma, a máquina velha. Eles davam pulinhos de alegria.
- Mãe. Será que alguém da família vai querer? heim? Ah, a gente vai ficar torcendo, torcendo para ninguém querer para a gente poder levar pra casa, isso é o máximo! O máximo!
Bem, enquanto estou aqui, neste “teclado”, estou ouvindo o plec-plec da tal máquina, que, claro, ninguém da família quis, mas que aqui em casa já deu até briga, de tanto que já foi usada. Está no meio da sala de estar, em lugar nobre, rodeada de folhas e folhas de textos “ impressos na hora” por eles. Incrível, eles dizem, plec-plec-plec, muito leag, plec-plec-plec.
Eu e o Zé até pensamos em comprar outras, uma para cada filho. Mas, pensa bem se não é incrível mesmo para os dias de hoje: sai direto, do teclado para o papel, e sem tomada!
Céus. Que coisa. Um beijo grande, Lúcia.’
É Lúcia, a nossa querida Alice Canabrava deve estar descansando em paz e rindo muito. E dê uns beijos nos filhos e agradeça a crônica pronta- pronta, plec-plec-plec, que eu ofereço aos meus leitores e leitoras.”

Fonte: PRTA, Mário. A máquina da Canabrava. O Estado de São Paulo, 12 mar.2003

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Óculos escuros



Hoje quero passar o dia de óculos escuros!
Não precisarei olhar ninguém nos olhos
Meu olhar poderá divagar por aí

Se meus olhos se enxerem d’água, ninguém há de perceber...
Será um segredo!
Vou olhar pra onde eu quiser
Vou encarar só quem eu quiser
E se não quiser olhar pra nada nem pra ninguém, fecho os olhos

Hoje os óculos fecharam o portal de entrada da minha alma
Ninguém terá acesso a ela
Ninguém olhará nos meus olhos!
Não, eu não vou tirar os óculos!

Paulinha Brum